sexta-feira, 29 de maio de 2015

"O Morcego" - Augusto dos Anjos

A realística embora metafórica comparação que faz o poeta de um morcego, chupador de sangue à implacável consciência humana é simplesmente brilhante;
A consciência é um destino inescapável e inexcludente a todos os seres humanos, daí a importância de darmos a ela a devida importância, de pensarmos nela com o devido respeito e temor, de falarmos sobre ela em todos os temas quantos nos forem possíveis e, acima de tudo, de recorrermos a ela antes que ela nos assalte surpreenda irremediavelmente!


O MORCEGO

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.

Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:

Na bruta ardência orgânica da sede,

Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

“Vou mandar levantar outra parede...”

-- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho

E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,

Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego

A tocá-lo. Minh'alma se concentra.

Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!

Por mais que a gente faça, à noite ele entra

Imperceptivelmente em nosso quarto!


Augusto dos Anjos



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